Direito & Design
O PODCAST DE LEGAL DESIGN
NOTAS DO EPISÓDIO
Temporada
1
Episódio #
02

Para que serve esse negócio? Legal Design como diferencial competitivo.

Advogados competentes? Conheço muitos. Num mercado de mais de um milhão de profissionais a diferenciação é questão de sobrevivência. Nesse episódio falo do legal design como diferencial competitivo e dou exemplos de aplicação em escritórios e departamentos jurídicos.

Introdução

[00:00:11] Uma das coisas que eu mais ouço quando eu digo que trabalho com Legal Design é: 

“Para que serve esse negócio?”; “A gente viveu tão bem sem isso até hoje no direito”; “Isso é uma moda, uma tendência”; “Por que isso de repente se tornou necessário?”.

Você já deve ter ouvido falar que hoje vivemos numa economia de experiência. Não basta mais ter um produto, é preciso entregar uma experiência para o consumidor. Para você ter uma ideia, onde eu moro deve ter umas cinco farmácias. Em qual delas eu entro? Nem sempre é aquela que tem o melhor preço. No Direito acontece uma coisa parecida. Muitos advogados entregam um ótimo trabalho para o cliente, são competentes, conhecem a matéria, e cumprem os prazos, mas entregar uma boa experiência passa por entender o que o usuário precisa. E isso já deixou de ser frescura faz tempo. Na verdade, é um diferencial competitivo, uma questão de sobrevivência, num mercado que tem mais de um milhão de advogados. E eu não falo só dos escritórios de advocacia, falo também dos departamentos jurídicos das empresas. É preciso garantir uma boa jornada de atendimento para os clientes internos. Entender os prazos e dinâmicas de outras áreas da empresa para entregar soluções jurídicas do jeito que as áreas precisam. Porque o RH não funciona do mesmo jeito que o marketing, nem igual ao financeiro.

Quando foi que tudo começou a mudar?

[00:01:53] Até algum tempo atrás bastava você ter um bom produto. Um exemplo corriqueiro é: 

Tomar café. 

Quando meu avô Vicente era criança, lá na década de 30, funcionava mais ou menos assim. A minha bisavó mandava ele comprar café na venda que eles chamavam de “Secos e Molhados''. Lá eles vendiam tudo a granel, em saca. O meu avô comprava meio quilo de café em grão e levava para casa. A minha bisavó torrava, moía, e passava o café. O meu avô me contava essas histórias tomando café e fervendo a água no fogão a lenha, na chácara onde ele morava e eu passei a infância. Nesse tempo quando eu era criança também comprava café com a minha mãe, mas de um jeito diferente. Na década de 80 quando eu ia ao supermercado com ela, a gente comprava café solúvel, o “Nescafé”. 

Ou seja, o café já vinha torrado, moído, embalado e no vidro. Eu achava aquele vidro de Nescafé super chique, com aquela tampa vermelha. 

Foto propaganda Nescafé 1981 [Fonte: Propagandas históricas]

No final dos anos 90 fui morar em São Paulo. E eu aprendi a tomar café na padaria. 

Antes de ir para o trabalho eu parava em uma “padoca” ali perto da paulista. Tomava uma “média” com pão na chapa, naquele copo transparente tradicional das “padocas”. Até hoje eu adoro o cheiro e o movimento de uma padaria paulista de manhã cedo. O humor dos chapeiros é uma coisa única. Você fica ali pescando os assuntos do dia e da noite anterior sentado no balcão. É tudo muito rápido, mas é único! 

Aquele café que eu tomava na padaria alguém já tinha torrado, moído, coado, colocado naquele copo de vidro e me servia no balcão junto com o pão na chapa e todo o movimento da padaria. Claro que eu não ia lá só para tomar café, eu ia por causa do pacote completo. E por que eu escolhi aquela padaria e não outra na região da Avenida Paulista?

Porque eu gostava daquela experiência. 

Café médio com pão na chapa [Fonte: Pinterest]

Experiências diferentes entre gerações

[00:04:09] Hoje eu gosto ainda mais de café só que agora ele é coado, sem leite, sem açúcar e numa xícara bem grande. 

Hoje também sei a diferença entre um grão e o outro, e, é justamente isso que faz eu escolher uma cafeteria.

Já a minha filha adolescente gosta de Starbucks. Ela gosta de escolher o tamanho do copo, ver o nome dela no copo, ouvir alguém chamar o nome em voz alta. Ela gosta das mesas, do wi-fi, dos cookies de chocolate. Gosta de fazer selfie com o copo, como muitas(os) adolescentes. E por incrível que pareça, ela não gosta de café. Ela entra no Starbucks e pede suco ou chá. 

Porque a cafeteria mais famosa do mundo não vende café! Ela vende EXPERIÊNCIA. 

É claro que quem gosta do grão vai atrás de qualidade, e quando eu posso escolher onde eu vou tomar café, além do grão, também vou em busca de uma experiência. Esse exemplo é um clássico da experiência do usuário e de como ela se transformou ao longo do tempo, desde o tempo do meu avô até o tempo da minha filha. Ou seja, já não basta mais entregar somente um produto, mais do que nunca, é preciso pensar em como o cliente se relaciona com o produto ou serviço que você entrega, e esse é o conceito de interação no design.

A interação com os serviços jurídicos

[00:05:32] No direito os clientes interagem com o atendimento que nós prestamos, seja ele presencial, à distância ou virtual, mediado pela secretária, pelo estagiário, ou por WhatsApp. 

As pessoas também interagem com as informações jurídicas que os operadores do Direito produzem. Documentos como contratos, pareceres e com as petições que tramitam no Judiciário. 

Quando alguém cria um manual ou uma plataforma de compliance existe uma outra ferramenta de interação. O manual e a plataforma são interfaces de comunicação. Quando o juiz lê uma petição ele se comunica com o advogado e a parte por meio de uma interface. Repare que tudo isso gera uma experiência. Participar de uma audiência, ser atendido por um advogado, ler, interpretar, e assinar um contrato, acessar um termo de uso de produto online, ou definir os termos de privacidade, gera uma experiência.

Quanto tempo duram essas experiências e como elas têm sido para as pessoas? Como tem sido interagir com produtos e serviços jurídicos? A proposta de utilizar a abordagem de design é justamente melhorar tudo isso. 

Aplicando no dia-a-dia

[00:06:50] O que o design pode fazer pelo direito? Como eu aplico isso no meu dia a dia? 

Se você advoga no escritório, pode melhorar o atendimento do cliente mapeando a jornada do atendimento, entendendo os pontos de contato. Você ainda pode produzir documentos jurídicos mais claros e adequados ao mercado que você atende. Sim, as necessidades variam conforme cada cliente. O cliente de agronegócios, por exemplo, tem necessidades diferentes do cliente de biotecnologia, que tem necessidades diferentes de um cliente de uma startup. 

Se você atua em jurídico de empresa, você pode usar o legal design para entender as diferentes necessidades, prazos e processos de cada área. Pareceres internos, por exemplo, precisam ser customizados conforme as diferentes necessidades, na elaboração e na linguagem.

Se você trabalha com contencioso, você pode usar o legal design para produzir peças jurídicas mais objetivas e claras. Não só do ponto de vista do Direito, mas principalmente explicar fatos e matérias técnicas de uma forma mais acessível para o juiz. Afinal de contas o juiz estudou direito e não tecnologia, engenharia ou medicina. E se você precisa explicar uma matéria técnica precisa fazer isso de uma forma clara. Além disso, não tem cabimento uma petição de 20 páginas no Juizado Especial Cível. Sempre dá para a gente falar de forma mais clara e acessível.

Você deve ter tido um bom professor na escola que explicava as coisas mais complicadas de um jeito que você entendia. Dá um pouco de trabalho, produzir material caprichado sempre dá mais trabalho, mas é possível. 

Mas para cada público, para cada usuário e para cada contexto de uso existe uma necessidade diferente. E a abordagem de design parte da observação do usuário e do contexto de uso para criar as soluções, porque a mesma solução não atende todos os públicos, é preciso observar e conhecer, e o design ensina a fazer isso. 

E não é só a jornada do cliente que precisa ser melhorada. Precisamos melhorar muito o trabalho dos advogados, para os advogados, com o Judiciário e internamente nos escritórios também, porque nós também somos usuários de muitas coisas. Somos usuários de procedimentos internos, das leis que a gente precisa entender e interpretar, das rotinas nos escritórios e nas empresas, do software jurídicos de gestão, dos BI’s e etc... A vida do advogado não é nada fácil. É tudo isso e mais prazo, pressão e ainda o design? Bom, o design vem para ajudar. 

Legal Design sempre é tecnologia?

[00:09:36] As Law Techs (empresas de tecnologia jurídica) estão aí para servir aos advogados. Tem muita tecnologia para melhorar a nossa vida, até porque não dá mais para viver sem tecnologia se a gente pode se beneficiar dela. 

Mas, será que Legal Design é tecnologia?

“Vou fazer um aplicativo no meu escritório. O cliente entra no aplicativo e a partir daí a tecnologia vai melhorar tudo! Vou comprar um software de automação de petições, e então a coisa vai andar”

Bom, pode melhorar muito. A tecnologia pode resolver várias questões, mas sozinha ela não vai atender as necessidades de nenhum usuário. Porque até para escolher a tecnologia você precisa antes conhecer o seu problema e a sua necessidade. Afinal de contas quem nunca comprou a tecnologia errada e gastou dinheiro com isso? 

Então não, o design não é tecnologia. Não no conceito contemporâneo. São coisas diferentes que andam juntas com bastante frequência, mas o Design pode ser analógico também. Design é inovação! Que pode sim se beneficiar da tecnologia. 

Quer ver? 

Para melhorar a jornada de atendimento de um cliente nem sempre eu preciso usar tecnologia. Para melhorar o entendimento de um contrato ou de uma peça judicial, eu também não preciso. Mas eu preciso entender esse usuário e o contexto em que ele vai usar essa solução que eu estou entregando, isso sim é design!

Não existe inteligência artificial milagrosa, e os robôs não vão acabar com o trabalho dos advogados. Eles vão acabar com o trabalho dos advogados que agem como robôs, o pessoal do Ctrl-C e Ctrl-V. 

Mas não é só no direito, isso é em todas as áreas. Na verdade, todo profissional robotizado vai ser substituído. E aí, a gente vai ter o privilégio de agir como humanos para pensar, observar, criticar, criar soluções e interagir de gente pra gente, porque nunca foi tão necessário ser humano.

Espero que eu tenha esclarecido algumas dúvidas, e, tenha ficado claro de como você pode aplicar o legal design na prática no teu dia-a-dia como advogado, advogada ou profissional do direito. Se não ficou muito claro me mande as tuas dúvidas também, sugestões e histórias. Tem muita gente que faz design, legal design a mais tempo e tem gente que está começando. Você pode falar comigo pelo site, pelo linkedin, ou pelo instagram também. 

E lembre-se que para fazer design é importante estudar, mas também é muito importante praticar. 

Então estude, pratique, divirta-se e conte comigo. 

O que isso tem a ver com o direito?

Algumas sacadas que você pode usar na sua prática diária
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