Direito & Design
O PODCAST DE LEGAL DESIGN
NOTAS DO EPISÓDIO
Temporada
1
Episódio #
04

É possível inovar em ambientes tradicionais?

"Trabalho em um ambiente tradicional. Como posso convencer meus sócios e colegas a experimentar o Legal Design?". Já ouvi esse dilema em várias versões diferentes. Qual o caminho? Alguns. Um deles é olhar para outros universos, muito além do direito, em busca de experiências análogas. No episódio #04 converso com a Kika Marquart. Violinista, produtora e empresária. Ela criou a Orquestra Filarmônica de Curitiba e produz espetáculos com músicas da Broadway e do cinema. Para viabilizar as produções - sem patrocínio nem incentivo - ela desenhou um novo modelo de negócio. Nós falamos de experiência do usuário, disrupção, cocriação, colaboração, desafios, erros e aprendizados. Você vai perceber que o mundo das orquestras e do Dirieto tem muito mais em comum do que você imagina.

Introdução

[00:00:14] Como inovar em ambientes tradicionais? Esse é o desafio de muita gente. Vocês não sabem quantas vezes já me perguntaram o que fazer para convencer o sócio, o colega, o chefe a experimentar uma nova abordagem, como a de design por exemplo. Você aí que está estudando, pesquisando, ou descobriu o legal design, você quer aplicar o que você está aprendendo, mas trabalha em um ambiente tradicional? A cultura dessa empresa ou do escritório ela não acolhe bem as mudanças? As pessoas com quem você convive são conservadoras, são reticentes. Você admira essas pessoas, elas são competentes, mas elas te dão um banho de água fria quando o assunto é inovação!

É importante lembrar que a inovação é um processo puxado por pessoas, e, que raramente começa de forma institucional. Ainda que seja institucionalizada, depois, a inovação começa com a iniciativa de alguém, que se transforma em um grupo e que vai florescer depois, ou não, conforme a cultura do ambiente. Mas alguém precisa começar a contagiar outras pessoas, encontrar ou criar um ambiente, e, isso não acontece só no direito. Hoje eu trago uma convidada que vai contar a experiência de inovação em uma área bastante conservadora, a música clássica. A Kika Marquardt é violinista, produtora cultural, e empreendedora criativa. Ela atua há 30 anos no mercado da música com performances, produções e direções artísticas de concertos e espetáculos culturais com múltiplas linguagens. Ela integrou a Orquestra Sinfônica do Paraná por 17 anos e participou de grandes produções do Teatro Guaíra. Já dividiu o palco com grandes artistas como José Carreras, Bibi Ferreira, Andrea Bocelli. Tocou ao lado de Toquinho, Frank Sinatra Jr, Jean luc Ponty, Hermeto Pascoal e muitos outros. Hoje ela é sócia proprietária da produtora Observatório Das Artes e diretora artística e fundadora da Orquestra Filarmônica de Curitiba. A Kika já produziu espetáculos em que a orquestra interpreta trilhas de cinema, da Broadway, além de um repertório infantil. Ela enfrentou resistência e preconceito, e, precisou redesenhar um modelo de negócio se reinventando profissionalmente.  

Vocês vão perceber que as orquestras têm muito em comum com escritórios de advocacia.

Quebrando as barreiras tradicionais

A arte e a criatividade sempre está de mãos dadas com a inovação, porque o artista sempre precisa se reinventar. A gente nunca pode ficar parada(o).

[00:07:18] Ser violinista é se especializar. Você se prepara, estuda, faz bacharelado (faculdade) para ser um técnico altamente especializado. Mas a partir do momento que você se entende como violinista e artista é necessário saber, também, trabalhar a criatividade. Em muitos momentos a gente volta à estaca zero para começar tudo de novo e se reinventar, porque o mercado está aí. 

Já dentro da orquestra eu comecei a descobrir que também tinha esse olhar de produção de palco. Será que não pode ter uma luz? Será que não pode ter um cenário? Por que sempre tem que ser igual? Por que a orquestra sempre tem que ser assim? Por que não se pode trazer coisas novas? (Eu me perguntava) Essa parte criativa da kika já estava ali!

Na época em que eu entrei na Orquestra Sinfônica, tinha um maestro, o Jamil Maluf, que trazia inovações nos cenários.  E mais do que isso, um envolvimento com o público. Nem todos os maestros têm essa pegada de falar com os novos públicos e trazer coisas diferentes.

[00:09:40] E eu vi que isso realmente era muito interessante, trabalhar a parte da criatividade junto com a música orquestral que é algo tão tradicional, porque é uma nova forma de chegar e conversar com o público. 

Cada maestro trouxe o seu repertório. Quanto mais repertório a gente tem mais a gente usa para ser criativo. Precisamos ter novos repertórios para ser criativo, porque os insights não surgem do nada. Você tem que estar com a bagagem ali, mas estar sempre se alimentando de novas informações e novas experiências. 

A parte técnica não é inimiga!

ANA - Assim como na música, o Direito necessita de uma formação técnica no meio acadêmico, e, certamente se mostra como um fator fundamental! Na verdade, se você não tem advogados que estudam e fazem tese, o Direito não existe. Sendo assim não haveria o que inovar ou ser criativo. A base deve estar bem fundamentada.  

E você, depois, foi atrás de uma formação pra ser uma pessoa de negócios que é a mesma coisa que acontece com Direito também, pois na Faculdade de Direito não tem nada disso. O advogado mais empreendedor e mais inovador que queira montar alguma proposta diferente ele precisa buscar isso depois. São as pessoas inquietas realmente que vão além. 

Não existe certo nem errado porque se não tivessem os bons técnicos músicos, do direito, ou, da medicina a gente não teria as super especialidades. Mas também tem um pessoal que voa para fora da caixa, extrapola e são inquietos, foi o meu caso.

KIKA - E tem momentos que flui mas tem momentos que não flui tão fácil assim. É um caminho sinuoso e não uma linha reta. Você até sabe onde você quer chegar, isso é importantíssimo, mas muitas vezes você está abrindo o caminho sozinho. E depois você vai até ser exemplo, talvez, para outras pessoas que vão te seguir. 

Não é uma tarefa fácil, mas em todas as áreas isso existe. O que a gente tem que fazer é buscar mais referências e buscar bastante informação para que possamos alimentar e trazer isso para nossa área. Na música não é diferente! E olha que a música é um super mundo. Tem a música popular, a música clássica, tem mercado. Mesmo nós achando que às vezes já está saturado sempre acontece alguma coisa nova, e sempre tem alguém inovando. 

Então é possível. Tem que meter a cara e ter coragem. 

by Freepik

Descobrindo novos mercados

[00:15:29] ANA - Você começou com esse repertório diferente com produções para o mercado infantil.

KIKA - Comecei porque além da minha questão pessoal, eu tinha acabado de ser mãe, eu percebi que não tinha tanta coisa no mercado infantil. 

ANA - Olha como a nossa vida pessoal influencia as nossas escolhas de carreira. E você só percebe depois que olha pra trás e vê que pegou aquele caminho na profissão por causa de um momento pessoal. Ser mãe, mudar de cidade, casar e conviver com pessoas que trabalham em áreas diferentes das nossas. Tudo isso faz a gente se abrir para outras realidades. Por isso que eu digo para as pessoas que é importante não se fechar só no mundo jurídico. As respostas não estão só nos livros e nos cursos.

Mas eai, o que você inventou a partir disso?

[00:17:13] KIKA - Sabe que quando fomos trabalhar com criança a gente teve que levar música clássica. E a nossa dúvida era como inserir a música clássica para criança.

Então preparamos de uma forma muito criativa um arranjo do Brasolim, que traz Mozart com ciranda brasileira e essa brincadeira musical é muito interessante. Interessante para quem toca, mas sobretudo para quem está ouvindo pela primeira vez. 

[MOMENTO DE MÚSICA]

ANA - Você poderia dar uma palhinha para a gente de uma coisa que você fez muito diferente de uma orquestra convencional não faria?

KIKA - Olha teve uma música, em especial, que foi muito pedida depois do primeiro Cinema in Concert, e que a gente resolveu colocar no set list das outras apresentações. Mas eu tinha certeza que eu tinha que trazer uma coisa ainda mais diferente, então, eu conversei com a Marina Prado, ela é uma acrobata de Curitiba, e nós fizemos ela e a bicicleta dela voar em cima da orquestra, enquanto tocamos essa trilha aqui. 

[MOMENTO DE MÚSICA]

Conversando com o público

ANA- Kika, você vem dos clássicos de Bach, Beethoven, Schubert. Como foi essa mudança de repertório, além do seu despertar como mãe? Como você foi desenvolvendo essa ideia do palco, do que as pessoas queriam ouvir, e, desse envolvimento com o público?

KIKA - Uma coisa que eu sempre deixo bem claro, inclusive sempre falo nas minhas mentorias, é que sempre precisamos ouvir o nosso público. 

Porque eles sempre vão estar ali. Então eles vão dar dicas, vão escrever, vão elogiar. E agora com as redes sociais a conexão fica muito maior e muito mais mais fácil. Não podemos desprezar porque sempre surgem ideias sensacionais do público. Eu acho que o importante tanto do artista, ou qualquer pessoa que está no mercado, é a gente construir uma relação com o público, com o cliente. Na música também não é diferente. Você cria um ambiente de cocriação com o seu público. Hoje isso é muito importante 

Quando eu tocava na orquestra sinfônica eu tinha um hábito, que eu vou abrir aqui para vocês, de todo domingo que a gente tocava, após a apresentação, eu ia para o final da fila do estacionamento. Eu fazia questão de ir até o final da fila e deixar para pagar por ultimo porque eu gostava de escutar as pessoas. 

As pessoas falavam “olha hoje foi tão importante vir aqui assistir vocês, porque me fez bem”. Então eu consegui entender o que as pessoas gostavam, o que elas não gostavam, como elas se sentiam, como elas não se sentiam. Às vezes eles falavam o que podia melhorar, qual música eles gostariam de escutar. 

É necessário dar atenção ao seu público. Muitas vezes eu achava ideias sensacionais, que me faziam ir direto a coordenação para falar sobre. Nessa época eu era violinista da orquestra, e, infelizmente não tinha tanta abertura, afinal de contas existia uma hierarquia que temos que respeitar. Mas é sempre importante dar relevância ao público. 

Em muitos momentos eu ficava um pouco frustrada por dar ideias que não seriam executadas pela orquestra, mas o público continuou ali, latente, dando ideias e querendo participar. 

[00:22:45] KIKA - Depois de 17 anos de orquestra o meu ciclo tinha se encerrado por lá, e, eu pensei que estaria na hora de ativar todas aquelas ideias que o público me dava. 

Como eu não tinha patrocínio e nem projeto eu pensava “será que eu vou ter coragem suficiente para fazer?”, “será que o público vai abraçar a idéia?”, “será que o público vai vir?”. 

Claro que a gente sempre calcula os riscos, e, obviamente os músicos sabiam do risco. Mas nós formamos uma orquestra e começamos com trilhas de filme, porque era uma coisa que as pessoas pediam muito. 

[00:23:22] Era uma coisa que não é tão inovação, porque várias orquestras do mundo inteiro já faziam isso e as pessoas queriam assistir isso aqui em Curitiba.

ANA - Então o primeiro espetáculo que você produziu com um repertório, além dos infantil, com a orquestra foi o de trilha sonora de cinema. 

KIKA - Sim, e foi um sucesso.  

ANA - Eu lembro. A gente passava em frente ao Teatro Guaíra, que aqui em Curitiba é o principal teatro, e ficava aquele outdoor enorme na frente do teatro com as imagens dos filmes. Tinha o E.T., o Poderoso Chefão, sempre anunciando o repertório. 

KIKA - Lotou muito rápido.  E depois que a gente fez de novo, lotou novamente. Então nós percebemos como as pessoas realmente queriam aquele conteúdo. As pessoas estavam sedentas desse tipo de material, de espetáculo. 

Então às vezes a gente tem que ter essa coragem. Se muitas pessoas tinham esse interesse, por que não? Por que não testar? Por que não fazer? Por que refrear essa vontade? 

ANA - Você estava me contando antes da gente começar a gravar. Da relação do público e da Orquestra. Existia uma espécie de muro, certo? 

KIKA - Durante muitos anos eu sentia que existia. Muitos artistas mais antigos falavam e me ensinaram que a gente tinha que entrar no palco, tocar e sair. Não existia conversa com o público. Então existia esse muro velado, o público lá e agente aqui.

[00:25:17] Mas não é mais legal você entrar num teatro onde você tem uma interação, onde os músicos entram sorrindo? Onde as pessoas se conversam, mesmo que seja por olhares mesmo que seja por risada. É tão mais leve você ir para o teatro onde você se sente mais conectada com quem está no palco. 

Então o que a gente vem percebendo, nos últimos anos, e não só com orquestra, mas com os demais grupos da cidade, do Brasil, no mundo de uma forma geral é que esse “véu” está caindo. Os músicos já estão mais conectados com o seu público, já estão conversando um pouco mais. Eu posso citar Emmanuele Baldini da Osesp, a Sinfônica de São Paulo, que é super presente nas redes sociais. Ele faz um trabalho super bacana de conversar, não só com os seus alunos, ou, com pessoas que admiram o seu trabalho. Mas ele está lá no Instagram, no Facebook e no Linkedin conversando com o seu público.  

[00:26:36] ANA - Quem disse que precisa ser sisudo né? É que nem no Direito. Você vai perder a sua qualidade técnica, o teu conteúdo, a tua seriedade e profissionalismo se você sorrir? Se você tiver empatia? Claro que não! 

[00:27:13] KIKA -  São rótulos que pouco a pouco a gente vai quebrando. É claro que na música clássica a gente tem uma seriedade, e precisamos ter em vários momentos, ela é importante. Tem momentos que você tem que estar muito focado naquilo que você está fazendo. Ser músico clássico, dependendo do repertório que você está tocando, chega momentos que você está no palco que é necessário ficar focado. Obviamente que ali não é hora pra você ficar sorrindo. Mas ainda assim existe aquela interação, aquela comunicação de olhares entre os músicos, que é tão bonito de ver. Porque o músico não é só o instrumento em si que ele toca, o corpo também é um instrumento. 

O que eu acho bacana também, não só do Baldini como de diversos outros artistas fazem, é compartilhar um pouco as suas histórias, as suas experiências. Como faz isso e como faz aquilo. Quanto mais a gente se conecta com as pessoas eu acho que o mundo enriquece! A criatividade aflora, as novas oportunidades aparecem. Então essa comunicação é muito importante. 

ANA - Isso é a empatia, e, é isso que constrói a experiência. A partir do momento que você não está só tocando ali no palco, mas no caso dos espetáculos que você tem o vídeo, a luz, essa outra parte do espetáculo, você gera uma interação. Você gera uma experiência! 

[MOMENTO DE MÚSICA]

KIKA - Então, essa relação é tão bonita. Essa energia que fica é muito gostosa, sabe? Dá vontade de voltar no dia seguinte e fazer tudo de novo. É muito gostoso quando você tem essa sinergia com o público.

Aproveitando as oportunidades

ANA - Você estava me falando que essa interação com público, também começou muito do pessoal querer músicos da orquestra no casamento, na festa. As pessoas quererem a presença do músico e da música clássica nos eventos delas. Mas que existia uma dificuldade técnica e burocrática, até porque os músicos tocavam na orquestra sinfônica. 

KIKA - Vamo começar por partes. Os músicos tocando em casamento sempre teve. Tem várias empresas que fazem casamentos com músicos. Dentro da orquestra nós temos dois nomes diferentes, Sinfônica e Filarmônica, que estão diretamente ligadas a natureza do trabalho. 

Quando você vê uma Orquestra Sinfônica, ela é uma orquestra totalmente mantida pelo Estado, ela é pública. E como um corpo estável ela não pode ser vendida para eventos particulares. Mas as pessoas procuravam muito o teatro para eventos. E foi assim que nasceu a Orquestra Filarmônica de Curitiba, que eu sou fundadora. As pessoas queriam para um evento, e eu montei o grupo. Era um evento de comemoração de empresa. 

Na hora de dar o nome eu escolhi o Filarmônica, pois é um termo de orquestra onde ela é filantrópica, nesse caso mantida por amigos e por pessoas da entidade privada. Não teria problema. Como os músicos são de Curitiba então ficou “Filarmônica de Curitiba”.

Alguns projetos começaram em 2012, quando fizemos projetos esporádicos. Até que em 2017, com a noção de que era difícil conseguir patrocínios, decidimos que nossa arrecadação seria por bilheteria. Daí realmente nasce, para o grande público, a Orquestra Filarmônica de Curitiba que até então as pessoas não conheciam porque era realmente eventos muito esporádicos. Mas foi a partir daí que foi criado a marca, e as nossas redes sociais.

Mas a Filarmônica é um projeto particular que foi começado por mim, que eu produzo, e que está sempre disposta a inovar.

ANA - Então a criatividade também te levou a encontrar um modelo viável de monetizar isso. E o projeto acontece em 2017 durante uma baita crise.

KIKA - Sim. E também coincidiu com o caso em que tanto eu como vários outros músicos e artistas, do Teatro Guairá, teve o contrato interrompido. Então a gente tinha que criar caminhos. Aliás todo mundo precisa criar caminhos em tempos de crise. 

É claro que fácil não é, mas a gente se ajudou. A gente trouxe as trilhas de filme e trouxe essa ideia, com a certeza de que a ideia iria vingar. Planejamos e trabalhamos muito na comunicação com as redes sociais, e fizemos todo o passo a passo bonitinho para conseguir vender e ter esse público. 

Foi assim que começou o “Cinema in Concert”, “Broadway in Concert”, e depois o concerto para crianças o “Fantasia da Disney”, e deu muito certo! 

O que nos preocupava era em relação a precificação. Porque existe um mito, uma tradição, de que muitos concertos com Orquestras geralmente ligados ao Estado, ou os preços são muito populares, ou são gratuitos. 

[MOMENTO DE MÚSICA]

ANA - E aí Kika como é oferecer um espetáculo ao público sem patrocínio, sem incentivo, só na bilheteria?

KIKA - No primeiro momento foi uma loucura. Para qualquer pessoa do mercado, orquestra, os músicos, qualquer pessoa que eu falasse em 2017 que eu iria fazer sem patrocínio, cento e cinquenta por cento falava que não ia dar certo.

Mas se eu tenho um produto que eu acredito e que tem qualidade. Se for feito uma boa comunicação, uma boa estratégia de venda, por que não? 

ANA - E você já tinha testado esse produto em pequenas doses né? 

KIKA - Sim. Então por que não?

Muitas vezes a gente fica refém da opinião do outro sabe? Eu falava que ia fazer e a maioria dos feedbacks que me davam eram ruim. Claro que nós temos que calcular os riscos, independente se é artista, produtor, pessoal do Direito, pessoal da medicina. Todo mundo no seu negócio tem que calcular riscos, mas tem momentos que você também tem que correr risco. Porque se você não corre o risco como é que você vai saber se vai dar certo ou não?

A gente estava num momento muito delicado, que vários músicos estavam sem seus empregos e a economia estava estagnada. Então eu fiz a proposta, obviamente com a mentalidade de que tinha que dar certo. Porque afinal de contas você tem que pagar muita gente, montar uma orquestra não é fácil. Tem os músicos da orquestra, o pessoal da luz, o próprio teatro e os impostos.  Mas eu acreditei muito na ideia e na qualidade do produto.

Então, o que aconteceu. Óbvio que muitos músicos entraram no palco menos acreditados de que poderia dar certo. E para surpresa, estava lotado o “Fantasia” (primeiro evento da Kika com o grupo). Parecia que a cidade toda estava lá. Várias pessoas dando os parabéns pela iniciativa. E isso, claro, pegou de jeito nos artistas. Parecia que os músicos tocavam com mais vontade.

ANA - Eu lembro, tinha um Mickey regendo na frente do teatro com a orquestra. 

KIKA - Foi tão bacana que teve na plateia pessoas que apareceram de cosplay do Mickey. 

Apesar de tudo isso por que o risco foi alto? A gente tem uma tradição no Brasil onde geralmente os preços, dos concertos, são populares ou são gratuitos, porque a gente precisa da acessibilidade para democratizar, e, para que as pessoas conheçam a obra, que elas venham ao teatro. 

É claro que a gente entende, isso é extremamente importante. Essa gratuidade da o acesso para o grande público conhecer a orquestra.  

Mas por outro lado se eu faço um produto particular, quase da mesma natureza, eu tenho um problema para precificar, porque as pessoas estão habituadas culturalmente aqui no Brasil de que a orquestra ou o preço é popular, ou o preço é gratuito. Aí que morava o grande risco. Não era o produto ou a trilha de cinema. Era a questão: “Será que as pessoas vão pagar para ver uma orquestra?” 

As pessoas tinham que entender que era uma orquestra particular e que sim, teria um ingresso mais caro. 

ANA - Você quebrou um paradigma, né?

KIKA - É um paradigma, e, é um paradigma muito forte. 

Então foi aí que morou a grande coragem e o grande risco, onde eu tive que lutar com essa cultura muito forte arraigada. Eu concordo totalmente que tem que ter a gratuidade e eu concordo totalmente que tem que ter acessibilidade, mas a partir do momento que você tem orquestras e grupos particulares a gente tem que aprender a se posicionar no mercado. 

Ok, as orquestras que tocam tem qualidade, são grandes orquestras profissionais, mas a nossa orquestra faz algo diferente, é outro mundo, é outro público, e, para nós continuarmos funcionando precisava que o ingresso fosse pago.

Mas isso tem que estar extremamente claro, tanto é que em vários concertos eu começava falando com o público, agradecendo por estarem lá e explicava a nossa situação. Teve vários momentos em que as pessoas aplaudiram, comprando a ideia, sabe? Eu falava sobre a gente ser uma orquestra diferenciada, particular e que por isso tinha aqueles preços. 

ANA - Foi um super trabalho de educação do público também, né? 

Porque depois que as pessoas entendem o modelo de precificação as coisas ficam mais claras. Olha quantos novos produtos e modelos surgiram nos últimos anos, a gente já não paga nem consome do jeito que sempre foi, do jeito tradicional. Para viabilizar é preciso esclarecer. Construir o produto, atendendo ao público, e explicando para as pessoas como é que aquilo funciona.

[MOMENTO DE MÚSICA

Os aprendizados da inovação

ANA - Dessa luta e glória, o que você me conta do aprendizado disso tudo.  

KIKA - É muito interessante e enriquecedor, porque a gente acaba mostrando o resultado de tudo, as fotos, vídeos e de tudo que deu certo. Mas para todos os acertos tem muitos erros também. A gente aprendeu a se comunicar de forma mais assertiva, pois cometemos muitos erros, inclusive na comunicação. Quando a gente vai mostrar o nosso trabalho para o mercado temos que mostrar de forma clara, para a pessoa que bater o olho entender. 

Foi todo um processo que além de ser técnica e violinista também tive que trabalhar com a divulgação. Tive que entender que o post nas redes sociais era importante, a imagem era  importante, o que está escrito era importante. Toda a parte interna, porque para lidar com equipes você tem que ser muito claro.

Então você vai aprendendo e errando, errando e aprendendo. Empreender, produzir e colocar no mercado suas idéias é assim mesmo. Vão ter vários erros onde você vai se questionar até se vale a pena continuar. Quantas madrugadas você fica acordado pensando se vai dar certo. Antes de estrear a orquestra eu posso dizer tranquilamente para quem está me escutando que aquela semana, provavelmente, cinco dias eu não dormi. E ainda fui dormir dois dias depois, porque a adrenalina do palco ainda fica. 

Claro que tem erros que não podem acontecer de fato, porque destrói todo o trabalho. Mas erros que são ajustáveis tudo isso faz parte do show, como diz Cazuza.  

É muito importante a gente também ser gentil consigo, se perdoar pelos erros, e não se martirizar. É preciso seguir em frente, para que depois você também possa dividir, como eu estou dividindo hoje essa história com vocês.

ANA - É impressionante porque à medida que você vai falando eu vou fazendo paralelos com o mundo do Direito, e,  eu tenho certeza que quem está nos ouvindo também está levando para o Direito. E eu sou uma das defensoras da linguagem clara, do falar de forma simples, e passar o conteúdo jurídico dessa forma. Tem até a vertente do Visual Law, que usa imagens e outras mídias para passar esse conteúdo de forma mais didática. 

E a gente não tinha falado disso nas nossas conversas, então eu nem sabia que você tinha esse perrengue para trabalhar com a mídia, com a divulgação, etc, isso você nunca tinha me contato.  

KIKA - Veja, eu sou violinista, e, de repente eu entrei no mundo das redes sociais que era onde eu ia divulgar o meu trabalho, então tive que entender um pouco. Obviamente que no primeiro post as coisas não ficaram tão claras, mas depois eu comecei a entender melhor como passar a informação (que é crucial).

ANA - É a comunicação, né? 

[00:51:29] Eu digo sempre que é o grande nó que existe entre cliente e advogado, e de quem usa o Poder Judiciário. Porque as pessoas não se entendem.  Acredito que na música também exista esse esse vocabulário meio de “gueto”. Essa coisa de “arte não se explica”, tem coisas assim, né?

KIKA - O artista não é treinado e formado para a parte Business na faculdade, não tem isso aqui no Brasil. Claro que já tem algumas faculdades que já estão começando a colocar, mas ele não sai de lá pronto para vender. Ele sai artista com sua formação técnica. Então muitas vezes quando ele vai se vender ou se colocar no mercado através do Instagram, por exemplo, ele vem com aqueles “textos de TCC”. 

Eu brinco com isso, pois eu faço mentoria para projetos culturais e criativos, e, geralmente eu peço para me mandarem um texto sobre o que aquela pessoa ou grupo faz. A princípio a pergunta é simples, com dez, cinco linhas você tem que explicar o que o grupo faz. Mas ai vem uns textos de TCC, de final de curso, explicando o porquê é importante e etc. Ou seja, é difícil simplificar, é muito difícil as pessoas reduzirem a informação e conseguirem se explicar.

Você tem que ser reto e assertivo. 

Eu até agradeço o espaço para falar disso, porque isso é realmente muito importante. Muitos artistas não fazem isso. É preciso falar em uma linguagem que eu, você, o “Pedro” e a “Maria”, todo mundo, mesmo que venha de três, quatro, ou cinco mundos diferentes entenda!

ANA - E vira uma competição, né? Porque hoje em dia você tem tantas outras músicas, tantas outras formas de entretenimento, que se você fica muito hermético, muito complicado, talvez aquela tua audiência desista, se ele é iniciante. Você estava me falando que esse repertório da Broadway é um repertório de entrada para as pessoas, que depois vão evoluir na música clássica.

KIKA - Eu acredito muito nisso! 

Claro que quando a gente traz grupos fazendo repertório um pouco mais popular obviamente que pessoas que são do erudito ficam um pouco ressentido, às vezes pensam que não é tão bacana. Por um outro lado estava acontecendo uma onda muito grande, não só no Brasil mas sim mundial, de que não estava tendo mais tanto público. Porque o público das orquestras estava praticamente envelhecendo e morrendo. 

Então você tem que atingir um público para que a orquestra possa continuar viva e acontecendo. A música clássica é tão sensacional, quem não fica extasiado? Mas para o pessoal começar nesse mundo das orquestras ela(e) pode ter assistido à sua trilha de filme favorito, para começar a perceber que é legal. 

ANA - Fica amigável, né?

KIKA - Sim! Muitas vezes esses populares são a porta de entrada. Muitas vezes o pai levou o filho, e o filho viu o Darth Vader tocando guitarra. Veja, é uma interação lúdica, mas que desperta interesse na criança.Às vezes até na pessoa que já fez faculdade, várias coisas, mas tem aquele sonho que ainda não realizou de tocar teclado ou violão,

Então esses novos mercados, que a gente também chama de nichos ou até mesmo oceano azul (que é um livro famoso), quando a gente entra neles e faz uma orquestra tocando trilhas de cinema também desperta uma parceria com o clássico e tradicional. Não são coisas opostas, na verdade, elas são bem complementares. 

ANA - Quanto paralelo com o mundo jurídico. A gente vive hoje essa cruzada do Visual Law, do falar claro, que é explicar o Direito para às pessoas de forma clara.

Eu sempre digo que se você colocar uma imagem, uma ilustração, você não vai infantilizar o teu público. Pelo contrário, essa vai ser a porta de entrada para ele se interessar pelo conteúdo. Essa vai ser uma forma de você explicar para essa pessoa que não tem um domínio desse tema, e, a pessoa vai ficar com mais vontade de entender, de se aprofundar, de ler.

Então é através da informação clara, é por meio da facilitação, que você vai despertar essas pessoas para um conteúdo mais denso. A gente vive no mundo jurídico, hoje, esse momento de trazer as pessoas de volta para que elas possam ter vontade de ler esse conteúdo que é tão hermético, tão difícil. E aí você me falando desse momento de aproximação através do repertório mais popular, é a mesma coisa. Você criar uma atmosfera realmente mais amigável e mais interessante. Afinal de contas hoje em dia a gente tem de consumir tanto conteúdo a gente tem que dar conta de tanta informação, porque não dar essa informação jurídica do jeito que as pessoas queiram ler e se animem a navegar por ela.

[MOMENTO DE MÚSICA]

ANA - Olha eu nunca imaginei que eu fosse ouvir essa expressão “Oceano Azul” que é tão de negócios e de marketing conversando com você, da música, falando para um público de Direito. Para você ver que nada mais está solto e sozinho no mundo, a gente é multidisciplinar e precisa saber de tudo isso mesmo.


KIKA - Com certeza! e acho que o mais importante é a gente saber que a gente é. Se conhecer de fato, porque toda essa experiência,  falando do Oceano Azul e marketing, foi toda uma construção minha ao longo do tempo.

Antes era a Kika que só tocava música clássica, mas também existia a Kika que gosta muito de trilha de cinema e que precisava ser despertada. Também  tinha a empresária que precisava saber mais de marketing. Então hoje eu vejo também que quando você sai em busca da sua jornada ou da nova experiência de empreender em novos negócios, o mais importante é você se conhecer, e você ser totalmente integral naquilo que você está fazendo. O autoconhecimento ele é fundamental para que você esteja forte e presente naquilo que você está fazendo. Seja nas produções de espetáculos, seja na escolha do repertório e seja para nosso ouvinte, para a área que você vai abrir, para a área que vai desbravar.

Então é fundamental a gente como líder, como pessoa que lida com equipes, e, que lida com essa questão da inovação na criatividade, a gente se conhecer, ser integral e 100% presente naquilo que está fazendo.

ANA - Eu sinto muita ansiedade hoje em dia nas pessoas. 

A gente está exposto a uma pressão muito grande para estar atualizado. No direito a gente fala muito dessa advocacia 4.0, do advogado contemporâneo, tecnologia, programação, marketing ou Legal Design, essa palavra esquisita. Então as pessoas ficam muito ansiosas pois elas podem pensar “Poxa, estudei tantos anos, fiz faculdade, tenho 20 anos de Direito, de música e agora eu ainda preciso inovar, preciso mudar”. Ou então, muitas vezes a pessoa se encontra em um ambiente totalmente tradicional e avesso a isso, e tenta puxar e liderar essa inovação. Até porque o que eu vejo sempre é que a inovação é puxada por algumas pessoas. É muito difícil ela ser uma iniciativa corporativa. Sempre tem aquelas pessoas que se interessam mais por isso e que têm essa natureza. Que querendo ou não é uma natureza de liderança, porque você vai ouvir muito “não” durante a jornada, e você precisa estar seguro.

[01:02:58] KIKA - Hoje eu percebo uma coisa, na prática do que eu vivi. A questão do inovar e fazer algo diferente no ambiente tradicional. Às vezes o lugar onde você está tem uma cultura muito fechada, onde você possa até fazer um movimento de inovação, mas se a cultura da empresa não permite isso talvez não seja um lugar ideal para você. Eu quero continuar nessa estrutura segura e tradicional? Ou será que está na hora de me conhecer e fazer outras coisas?

Talvez o ambiente onde você está não permita que você inove, a cultura organizacional não permita. Tem outras empresas que já estão mais abertas a isso. Mas se a cultura onde você está é extremamente tradicional, pode ser que você dê murro em ponta de faca, que nem eu fiquei por muitos anos. E aí você se frustra, porque essas ideias não vão para frente. 

Para trabalhar em um ambiente inovador e criativo você tem que estar muito seguro de si, você tem que ser integral, você tem que entender quais são as suas crenças e seus valores. Eles devem estar de acordo com essa empresa ou com o escritório onde você está.

ANA - E isso vale para qualquer profissional.

KIKA - Sim, isso vale para qualquer profissional. Porque se você está em conflito onde está, fica numa boa, porque você tem uma super trajetória. Respeite isso e parta para um novo caminho.

ANA - Você me falou que você é violinista. Então a violinista fica ali com mais outros violinistas. Você não era solista, você não reagia. E aí não é normal isso partir de alguém ali da “massa”, né?

KIKA -  Quando você faz a faculdade você escolhe ser um(a) violinista de grupo ou sai para ser solista. E ser solista nunca foi a minha natureza, eu sempre gostei de trabalhar em grupo. Sempre trabalhei em equipe. Eu achava o máximo quando eu estava nas últimas cadeiras da orquestra, porque eu adorava ver aquele mar de gente em cima do palco, eu gostava de estar na equipe.

É um pouco contraditório porque quando eu comecei a trabalhar com produção você meio que fica sozinho, você lidera. E quando você começa a entrar no empreendedorismo você tem momentos muito sozinhos, é muito solitário. Então uma pessoa, como eu, que sempre gostou de estar no meio de gente e trabalhar com equipe, teve esse momentos da solidão que te pegam um pouco. 

Aí então, mais uma vez, o autoconhecimento é tudo nessa hora. Saber o que você quer fazer e onde você quer chegar. Não é fácil. Não é uma jornada fácil, porque se conhecer realmente é um trabalho diário, mas vale a pena. 

Vale a pena porque depois você se vê no seu trabalho. A sua natureza que está ali, a sua assinatura que está ali. Você se realiza fazendo o trabalho.

Pessoal quem está estudando para concurso, que está num ambiente mais inovador, que não está no ambiente menos inovador e quer puxar essa inovação, tudo isso a gente leva pro Direito, porque são experiências muito muito análogas. Essa questão do autoconhecimento, do cair Levantar todo dia. Tem dias que a gente está super conectado, mas tem dias que a gente vai para o fundo do poço.  

KIKA - Se existe uma palavra que tem que estar presente até como um valor é “persistência”. Porque em qualquer área isso é fundamental.

ANA - E encontrar quem tem isso também, né? Eu tenha certeza que nessa jornada você encontrou pessoas que disseram “UAU, que demais!”. Assim como teve gente que mostrou todos os problemas do mundo, tinham pessoas criativas e sonhadores que te deram força, fazendo até você encontrar a sua turma nesse caminho.

KIKA - É fantástico, porque é realmente isso. Você vai encontrando parceiros ao longo da jornada fantásticos. E a gente aprende com as parcerias que o outro fala também. Então aprendemos a escutar o lado do outro. Você tem a sua idéia e a outra pessoa também, e assim a gente troca e constrói junto.

Até porque quando você sai para tua jornada você quer se afirmar. Muitas vezes você acha que é a sua ideia e acabou, não escuto mais ninguém. Você tem que trabalhar persistência sim, mas também a flexibilidade. Você fala, seus parceiros falam e assim todos vão construindo.

Outra coisa é que às vezes você tem ideias e elas se tornam balões em cima da gente. Você pegou esse balão, mas outra pessoa também pegou, e outras pessoas começam a pegar, e aí você tem que aprender que as ideias, o teu trabalho, uma vez que ele está colocado para o público ele vai para o mundo. Você tem que aprender que são filhos que você dá para o mundo, e, que é necessário desapegar. Desapegar também é muito importante e faz parte do crescimento como pessoa. 

É maravilhoso trabalhar com inovação. é fantástico trabalhar com criatividade e o que eu deixo de recado de tudo isso, da minha jornada, é: “A magia só acontece quando você descobre quem você é, você pode ficar tranquilo que ela acontece”. 

ANA - Kika, você não é designer, né? Tem certeza de que não estudou Design?

Tem um baita processo de Design nesse seu caminho que você fez. Isso porque você escuta, observa o usuário, protótipa, testa, corre risco, erra, itera (iteração), e continua!

Para quem acompanha o podcast e se interessa pelo design, eu acho que ficou muito claro para vocês, a medida que a Kika contava a história, todos esses passos do processo de Design. E ela não é Designer. Então assim, Design é para todo mundo, todos podem ser Designer.

ANA - Quantos espetáculos você já produziu? 

KIKA - Com orquestra nessa pegada já são onze com a orquestra.

E vem mais por aí, com certeza, a gente não para.

Conclusão

Eu acho que todo mundo ficou curioso para ouvir a orquestra. A gente encontra conteúdo no YouTube e nas redes sociais. Os links estarão nos “links úteis" logo abaixo. Aproveite!

O que isso tem a ver com o direito?

Algumas sacadas que você pode usar na sua prática diária
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