Introdução
[00:00:11] A ideia deste podcast é falar do design aplicado no direito, e, falar do design para os profissionais do Direito. Nesse tempo de pandemia - e pandemônio de informação - eu fiquei pensando o que seria relevante tratar por aqui, já que tem tanta live, tanto post, tanto podcast falando do corona e de crise. O que falar nesse contexto? Então lembrei de uma palavra muito presente no design que faz toda diferença:
“CONTEXTO”
É assim que nos encontramos no momento, vivendo um novo contexto. Continuamos existindo, trabalhando, estudando, comprando, vendendo e convivendo. As mesmas pessoas, as mesmas instituições, mas dentro de um contexto completamente diferente e inesperado para o qual a gente não estava preparado ainda.
O novo contexto
[00:01:14] Eu sempre falo de contexto nas minhas aulas, porque aprendi com meus bons professores que contexto muda tudo. Você pode projetar uma solução para o usuário, fazer pesquisa, testar e lançar, e depois de um tempo o contexto de uso muda e a solução precisará ser revista. Normalmente quando dou aula preciso dar muitos exemplos para os alunos. Hoje essa lição está clara, pois o que nos servia tão bem já não funciona mais e precisa ser repensado. É como se a gente tivesse sido lançado a um modo de prototipagem sem fim, dia após dia.
Estamos testando novas formas de relacionamento, trabalho, estudo, rotinas e atendimento na área de saúde. Empresas que pensavam a muito tempo em adotar o home office não tiveram outra escolha, e a adoção de tecnologia aconteceu no susto. O ensino à distância teve que ser implementado a toque de caixa pelas instituições de ensino e até quem não sabia cozinhar está aprendendo na marra. Não deu tempo de montar o melhor curso online e escolher a melhor ferramenta tecnológica, nem cozinhar a comida do Chef, mas sim, a gente está se virando.
E aí me caiu a ficha de que o direito pode aprender muito com isso neste momento. Não dá mais tempo de pegarmos três Legal Opinions para decidir qual é a melhor solução, nem esperar para entender o cenário completo antes de responder às perguntas do cliente.
O design trabalha com observação o tempo todo. O olhar para o ser humano e o comportamento de grupos nunca foi tão importante. Os antropólogos estão trabalhando loucamente, e, a gente deveria prestar muita atenção no que eles estão dizendo. Até então se olhava muito os problemas em caixinhas. Economia, saúde, negócios e relações internacionais, e aí, vem o Corona e mistura tudo. A pandemia afetou a saúde, economia, os negócios, as relações de trabalho e as relações entre os países.
E é observando esse cenário macro de forma coletiva - com uma visão multidisciplinar - que podemos ter pistas. Pistas e não respostas, porque é preciso também um olhar de forma sistêmica quando tudo está tão relacionado. E ao mesmo tempo fazer um recorte do problema que o teu cliente está enfrentando, para que você tome uma decisão que funcione nesse momento.
Esses dias eu ouvi que o advogado é o médico das organizações. Eu acho que faz muito sentido, visto que em tempo de crises e doenças, nós advogados trabalhamos mais do que nunca na gestão dos conflitos - isso é uma das especialidades dos profissionais do Direito. Só que essa crise é diferente de qualquer outra. Ela não se parece com nada que a nossa geração já tenha vivido. Já tivemos guerras, pandemias e epidemias, mas certamente não vimos nada parecido com isso. Nada que tivesse a mesma proporção, nada que tomasse atenção do mundo todo ao mesmo tempo e o tempo todo. A gente está vivendo um “mono” tempo. Os nossos modelos mentais e as nossas certezas já não servem mais para muita coisa, porque nós estamos diante de um novo normal.
Lidando com os clientes em tempo de crise
[00:05:43] Mas o que é que os nossos clientes querem? O que é que os clientes dos advogados precisam nesse momento? Como é que a gente se posiciona de forma assertiva e realmente ajuda os nossos clientes?
Usar a mentalidade do design pode ajudar os advogados nesse momento!
Se a matéria prima do direito é o caos, a matéria prima do design é a incerteza. Nos processos de design trabalhamos o tempo todo questionando e desenrolando o que está à nossa frente. E esse é o ambiente agora - de incerteza. Se o advogado é o médico, nós também precisamos aceitar que o remédio que prescrevemos tem indicações, e sempre, efeitos colaterais. Não dá para dar uma solução que resolva tudo! Para isso, a gente precisa entender qual problema o cliente precisa resolver agora. Que efeitos colaterais da solução podem ser aceitáveis. Quais os impactos humanos, financeiros e de imagem essa solução oferece. Quais riscos o meu cliente prefere correr. É o momento de estar junto com o cliente - co criando e fazendo escolhas. É o momento do advogado avaliar o patrimônio contratual desse cliente - todo o acervo de direitos e obrigações - mas de uma forma sistêmica. Nós estamos enfrentando um tema hoje extracontratual. As cláusulas de força maior, quando elas existem, não dão conta de tudo. E nesse cenário de incerteza é preciso coragem e criatividade para testar alternativas que nós nunca havíamos pensado - porque nunca tínhamos enfrentado uma situação parecida.
Criatividade! A necessidade é a mãe da criatividade. E mesmo com medo, vamos descobrir que com pressão e urgência nós ficamos sim mais criativos. Às vezes fica difícil ser criativo com tanto assunto bombando na cabeça, mas nós vamos precisar ser.
E é a hora de falar claro com o cliente, de entender o que ele precisa. Ser assertivo, corajoso e principalmente não ter medo de errar - porque vamos errar. Mas vamos errar escolhendo o que seria a solução para esse momento, dentro desse contexto.
Pessoas! Eu sempre digo que o designer começa e termina nas pessoas. Acredito muito nessa ideia, porque as soluções que nascem a partir da observação funcionam.
Mas mesmo acreditando, muitas vezes eu sentia esse conceito um tanto distante e até mesmo abstrato. Principalmente quando ele era repetido de forma acadêmica, longe do campo da prática e das tais pessoas para quem a gente está pensando na solução do problema. E de repente ficou tudo muito claro. Porque neste momento o CNPJ se tornou em CPFs, e o escritório invadiu a nossa casa. Fomos lançados para dentro da nossa intimidade, sempre nos perguntando “o que é essencial?”, como se a gente tivesse sido lançado para a base da pirâmide de Maslow. Estamos nos preocupando com as nossas necessidades mais básicas.
Produzindo informação mais clara
[00:10:38] Como já dito, a comunicação clara e objetiva é mais importante do que nunca agora, pois está tudo muito incerto e muito complexo.
A gente precisa tornar a complexidade acessível para os nossos clientes mais do que nunca, dentro das nossas possibilidades no momento. Transformar decretos, medidas, e sentenças em informação clara e sob medida para a necessidade do cliente.
E como o meu negócio no Design e no Visual Law é esse eu resolvi dar aqui algumas dicas de como produzir informação clara - sob medida para o cliente - a toque de caixa. Não tenho nenhuma pretensão acadêmica e nem de curso. Mas eu acredito que com alguns passos dá para melhorar essa informação que passamos para os nossos clientes.
Primeira dica:
Entenda para quem você está produzindo a informação. Quem é o seu leitor? Que nível de entendimento jurídico ele tem? Ele é um diretor jurídico, gerente jurídico, dono de uma empresa, funcionário? Até que ponto ele vai na informação jurídica;
Segunda dica:
Coloque-se no lugar desse leitor. Que tipo de informação ele está acostumado a consumir? Como ele está acostumado a consumir?;
Terceiro dica:
O porque o leitor precisa dessa informação. Se ele resolveu ler isso que você vai produzir, porque ele precisa ler isso? O que é que ele precisa entender ou decidir?;
Quarta dica:
Pense em escrever para dar autonomia para essa pessoa que está lendo, para que a informação seja suficientemente clara. Essa pessoa deve compreender tudo e esse tudo seja apenas o que ela precisa saber, sem precisar de maiores explicações;
Quinta dica:
Ofereça mais detalhes sim! Em links, referência e fontes. Por favor cite as fontes, cheque as fontes ninguém precisa de mais Fake News - e é óbvio que um profissional do Direito não vai passar Fake News - mas é um alento quando a gente vê a fonte em baixo. E se o teu leitor quiser se aprofundar ele vai escolher um link ou uma referência, mas sem que você sobrecarregue esse leitor com isso;
Sexta dica:
Visual. Como você transforma isso visualmente, de forma agradável. Não se preocupe com grandes pirotecnias de design gráfico nesse momento. Se você pensar na mensagem clara e trabalhar um bom português, o objetivo é simples mais do que meio caminho andado. Mas quer melhorar o visual.
Minha primeira regra básica. Alinhe seu texto sempre da esquerda para a direita. Escolha uma fonte legível dentro do contexto que essa pessoa vai ler. Ela vai ler pelo WhatsApp? Ou vai ler numa tela de um desktop? Escolha uma cor também agradável para contrastar, ou, duas cores para contrastar. Não use vermelho, não assuste seu cliente. Não exagere e não use caixa alta. Se você souber usar ícones e o Canva, explore. Mas dê espaço para a informação principal, para que o mais importante apareça. A gente já está com muito ruído na cabeça para precisar interpretar muita firula. Use português claro, sem excessos, sem adjetivos. Não transcreva artigos de lei, explique de forma clara, recomenda e principalmente acolha. Acho que todo mundo está precisando disso nesse momento acolhimento. Se a gente não pode ter certezas, acolhimento a gente consegue ter.
Conclusão
[00:15:07] Me parece uma boa ideia aproveitar esse período pra olhar para essas coisas. Para dentro de nós e em volta também.
E nesse período a gente deve aquietar um pouquinho a nossa mente e não ceder a essa gincana de superprodutividade. Quem faz mais live, quem escreve mais artigos, quem presta mais contas do que está fazendo. A gente não precisa fazer isso o tempo todo. Mas precisamos de tempo e energia para captar o que é fundamental e entender a essência disso que está acontecendo em volta da gente.
Porque depois que isso tudo passar - e vai passar - essa nossa percepção do agora vai fazer muita diferença, para decidir no futuro. A gente está trabalhando em modo de sobrevivência. Quem tem sorte está se adaptando ao home office, quem não tem está fora de casa. Tem gente que não tem nem “Home” nem “Office” pois mora em situação precária - precária emocionalmente e fisicamente. E tem gente que também não sabe se vai ter trabalho, ou seja, o futuro está suspenso.
Ninguém sabe. Ninguém tem certeza de mais nada e talvez essa seja a nossa salvação. Aprender a viver na incerteza, não era isso que o mindfulness nos dizia? “Vamos viver no agora”.
É o contexto que temos para hoje. Então não é hora de se cobrar tanto, não se cobre tanto. Não queira um grau de produtividade altíssimo, porque quarentena não é maratona de produtividade. Pode até sobrar tempo, mas está faltando energia, porque a gente está usando essa energia para nos adaptar e sobreviver. E acredite o nosso equipamento humano ele foi desenhado para enfrentar o caos. Para sobreviver a pestes, fugir do inimigo. Então é importante dormir alimentar-se, tomar sol e todas aquelas coisas que a gente tem ouvido.
Está difícil de desligar das telinhas depois de um horário da noite, né? Mas a gente precisa fazer isso, porque a tecnologia evoluiu bastante, mas a nossa máquina humana continua precisando das mesmas coisas. Então alimente-se com boa energia e se dê uma trégua também. Aproveitar o período para observar e se observar, entre um perrengue e outro e um alto e baixo desses que a gente anda sentindo, se de o direito. Fale com as pessoas e pergunte, mesmo de longe.
Chega perto de longe, a gente está descobrindo que isso é possível. E também ficar sozinho de verdade. Mas duvidar da mente o tempo todo e duvidar das crenças que nos serviu até outro dia, porque a um novo normal por aí, e, a gente ainda não sabe que novo normal é esse.
Observar sem julgamentos nem buscando respostas. Ouvir, deixar as pessoas falarem. Que o nosso interior fale também, porque embora distantes estamos próximos e nunca estivemos mais nus.
A gente está vendo aí nas lives, nas redes sociais, as pessoas se expondo com menos máscaras e isso também é uma boa oportunidade para a gente entender o que está em volta da gente. Observar nossos amigos, clientes e as pessoas que trabalham com nós ou para nós. Pode ser um período muito interessante. Mas que seja tão breve, quanto fértil.
Fiquem em casa, cuide-se e conte comigo.